domingo, 28 de julho de 2019

A quem serve a polarização direita x esquerda?


Photo by Kyle Glenn on Unsplash

Não estou em paz com o modo como a sociedade brasileira tem tratado as divergências ideológicas.  Eu já reclamei muito do desinteresse do brasileiro por política, e se conseguimos passar essa fase, hoje o nível de animosidade quando esse assunto surge em alguma roda é tão grande que sinto que não conseguimos convergir em questões básicas, o que é necessário para avançarmos como sociedade para um mesmo rumo.

Essa dinâmica tende a agremiar diferentes ideias em apenas 2 lados, paralisando as discussões. Tipo, “se eu sou contra a reforma trabalhista e quem é a favor está defendendo a reforma da previdência, então também sou contra a reforma da previdência”. Ora, e porque simplesmente não podemos ser a favor de uma e contra a outra?

A representação máxima desse comportamento foi quando deputados do PSL clamaram por um depoimento de Glen Greenwald na Câmara e, quando viram deputados de partidos como PT celebrando essa proposta, rapidamente voltaram atrás. Ou seja, o antagonismo em relação ao partido "adversário" define mais no que acreditam do que suas próprias bases ideológicas.

Esse comportamento esteriliza a troca de ideias, algo muito nocivo à evolução da sociedade. Assim como na biologia, a miscigenação genética de ideias é fundamental para o desenvolvimento do pensamento social. Sem um contexto para tanto, o que se tem é uma paralisia nessa troca, com a polarização representada por “direita x esquerda”.

Políticos populistas têm usado com sucesso esse discurso pasteurizado e de fácil assimilação para divulgar sua própria marca. Esse recurso tornou-se ainda mais popular com as redes sociais, que permitem um by-pass da imprensa pelo político, contatando diretamente um cidadão menos informado e suscetível ao viés de confirmação de seus próprios conceitos.

Uma abordagem menos superficial é ampliar os matizes ideológicos para 2 dimensões: econômica e social. A econômica tem como seus 2 extremos a intervenção mínima e máxima do estado na economia, e a social tem em seus 2 extremos o conservadorismo e o libertarianismo.

Nessa visão, se você for a favor da taxação de grandes fortunas e da união homoafetiva ainda sim será coerente. Mas ela só amplia a quantidade de grupos ideológicos de 2 pra 4, o que ainda é bastante insuficiente para representar a diversidade de partidos que tomamos hoje.

Pra reforçar meu ponto, vou colocar aqui minha posição referente a alguns temas mais polêmicos: sou a favor de taxação de grandes fortunas, união homoafetiva, e Bolsa-Família, temas associados à esquerda; e privatização de estatais, redução da maioridade penal para 16 anos, e reforma da previdência, temas associados à direita.

Veja que há posições para todos os gostos. Se você se identifica com uma das posições e discorda de outra, o melhor caminho é que você argumente comigo respeitosamente e aberto a mudar sua própria posição. Simplesmente alinhar-se comigo em todos os pontos porque concordamos em um deles, ou discordar de todos porque discordamos em um deles, vai fazer com que eu nunca tenha a chance de entender um ponto-de-vista diferente. E isso, em uma escala da população do Brasil, é o cerne da antidemocracia.

A última eleição presidencial foi uma manifestação especialmente nefasta desse comportamento. Gosto de perguntar aos meus amigos que votaram em Haddad e que votaram no Bolsonaro, quantos eleitores do outro candidato conseguiram convencer. A resposta que sempre recebo é que sequer conseguiram conversar com o outro.
Ou seja, milhões de monólogos paralelos que neutralizam a troca de ideias e opiniões.

Então, você sabe a quem interessa essa polarização. Aos figurões políticos que, como pastores, oferecem a salvação em troca do dízimo da militância. Mas talvez você não saiba a quem não interessa: não interessa a você. Então te convido a deixar de alimentar esse antagonismo.