terça-feira, 4 de fevereiro de 2014

Novas fábulas brasileiras - Volume 1


Caturama Febiriçá era um indiozinho que vivia em uma floresta linda. Ali tinha mais bichos-preguiça que em toda a região vizinha. Ele gostava de panhar as frutas pela floresta, especialmente as vermelhas, ao mesmo tempo azedas e doces. É claro que pra ele não eram azedas e doces, ele não conhecia essa classificação; pra ele essas plantas tinham um tipo específico de sabor, que não se incomodou em nomear, mas quando pensava era vermelho e pequeno.

Desde criança era o colhedor de lenhas da aldeia. Aos 7 anos, trazia toda a lenha do desjejum. Aos 10, desjejum, almoço, e rituais de adoração ao fogo e ao rio. Aos 16 era responsável por todo o abastecimento da aldeia, colhendo mandiocas, transportando lenhas e potes e mais potes de água.

Pela manhã, sentia uma disposição incomum aos seus colegas da tribo, sempre entusiasmado a atender favores além dos seus afazeres diários. De tanta atividade, Caturama ficou com o lombo preto de tanto trabalhar no sol. Aos 18 anos, do marrom-claro-avermelhado passou para o negro-amarronzado. Ficou bem negro mesmo.

Um malfadado dia, Caturama se envolveu com a filha do pajé, desonrando-a. Seu vigor físico, enrijecido por anos e anos de trabalho, ficou evidente no corpo da mocinha, marcado em vergões pela vontade de Caturama.

Naquela tribo, desonrar era questão de vida ou morte. Mas o pajé sabia do papel de Caturama na tribo, o quão vital era. Ele seria o cacique, sem dúvida, mas aquilo não podia passar em branco. Então o pajé decidiu puni-lo com uma maldição: “Seu cheiro será repugnante a quem te encontrar a primeira, a segunda, a terceira vez. Depois, se acostumarão e até gostarão. E então irás morrer.”

Todos da tribo passaram a evitar seu contato, pois não gostavam do seu cheiro. Sozinho, Caturama recolheu-se ao que era mais natural a ele, o trabalho. Quando passava longas jornadas na labuta seu cheiro se acentuava, e ficava ainda mais isolado.

Foi rejeitado por todas as mulheres da tribo durante muitos anos. Até que, de tanto sentirem seu cheiro, se acostumaram e se apaixonaram. E então ele morreu. Muitas pessoas ficaram perto do seu corpo enquanto ele se decompunha, pois o aroma era fantasticamente agradável, e queriam beber aquele cheiro quente, acolhedor e animador ao mesmo tempo.

Naquele local nasceu uma fruta vermelha e de sabor exótico. Chama-se café.

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